O que aprendi com a exposição “Brinquedos à mão”

Domingo quente de verão, crianças olhando insistentemente pela janela saudando o sol e invejando a liberdade dos pássaros, resolvemos fazer um passeio especial e que há algum tempo estava agendado em nossa lista de intenções: conhecer a exposição Brinquedos à Mão – Coleção Sálua Chequer, no espaço da CAIXA Cultural Rio de Janeiro.

O acervo é impressionante: mais de 1.300 objetos, utilizados pela infância de antigamente e ainda muito presentes nas comunidades nordestinas, tudo reunido pela curadora Sálua Chequer.

Sálua Chequer, por Rodrigo de Oliveira

Pouco conhecidos das crianças dos grandes centros urbanos de hoje, os brinquedos expostos foram feitos à mão por artesãos que transformam barro, pedaços de pau e de pano, latas de óleo e caixas de papelão em objetos capazes de despertar emoções e fantasias, estimulando a criatividade e a afetividade.

Apesar de não ser permitido tocar ou brincar com as peças expostas, as crianças que forem à exposição não tem do que reclamar, pois poderão brincar à vontade no espaço Cantinho do Brincar, com objetos lúdicos como cinco Marias, pula corda, bolinhas de gude e piões, entre outros, todos propostos pela própria professora Sálua. Muito bacana e divertido, colocando a prova a sua fala de que “(…) criança é criança, em qualquer lugar do mundo, e o encantamento existe onde ela estiver”.

A exposição
As peças que compõem a exposição foram coletadas ao longo dos últimos 30 anos, durante pesquisas de campo de Sálua, em diversas cidades do interior e nas capitais. Os brinquedos foram adquiridos de artesãos, presenteados por amigos e garimpados em feiras livres de Bahia, Sergipe, Alagoas, Pernambuco, Paraíba, Ceará e Piauí.

Para chegar ao formato final da mostra, os curadores levaram em conta o diálogo entre três olhares: de quem criou o brinquedo, da colecionadora e do espectador que se encanta com o objeto. Em foco, a recuperação da importância e do valor pedagógico dos brinquedos populares como referência para as antigas e as novas gerações.

Brinquedos-a-mao-Caixa-Cultural-Rio-interna-2.jpgExpostos em suportes diversos, os brinquedos não são apresentados como peças de museu: convidam ao movimento, representam cenas do cotidiano e utensílios de trabalho, como pequenos moedores de cana-de-açúcar, carro de boi e moinhos de água. Há ainda mobílias de madeira e miniaturas de utensílios domésticos para a tradicional brincadeira de casinha, além de brinquedos mais conhecidos, como pula corda de sisal, peteca e piões, e peças indígenas como barquinhos à vela e boneco de pena e argila.

Alguns brinquedos poderão ser manuseadas por adultos e crianças que visitarem a exposição. Segundo o curador e artista visual Zé de Rocha, o brinquedo popular traz em si o encantamento dos jogos lúdicos. Não são objetos criados para o prazer visual, são obras que incentivam a interação e a troca. “Um simples pedaço de pano ou madeira tem a capacidade de, numa simples brincadeira, criar mundos e transformar vidas”, diz.

Aprendizados
Antes de ir para a amostra, pesquisei a respeito do trabalho e pensamento da professora Sálua como educadora, musicista, pesquisadora e brincante. Encontrei várias falas que me chamaram muito a atenção e abriram meu coração rumo ao desejo sincero de uma aproximação com seu trabalho. Numa entrevista, dada ao jornal O Globo (alguns desses links eu selecionei e disponibilizei ao final do post, para quem quiser se aprofundar), destaquei uma frase que me tocou muito: “A gente deixa de ser criança quando quer”.

Sua coleção é a prova real de que a grande magia do brinquedo é cair nas mãos de uma criança e ganhar vida. E, no caso específico dos brinquedos artesanais, destaca-se a qualidade de permitir que a criança invente, desenvolva sua história, crie. “O brinquedo pronto amolece a imaginação” diz a pesquisadora. E é verdade! A começar pelo processo de criação, onde não é difícil notar a diversão e a brincadeira já a partir das mãos do artífice.

Ao ver meus pequenos se divertindo ao perceber as possibilidades e interações possíveis em cada brinquedo, ou combinações de brinquedo, percebi o quanto esta simplicidade provê o encantamento, o livre e descompromissado brincar, a essência real da infância. Foi emocionante perceber como esses objetos realmente ganham nomes, histórias, regras próprias e toda uma significação que socializa, permite encontros, expande a criatividade e iguala as condições sociais sem a necessidade de grandes aparatos, marcas ou recursos que muitas vezes tolhem, enquadram, achatam e se repetem.

Brinquedos à mão, por Thiago Sabino

“Enquanto houver infância vai ter brinquedo”, diz Sálua. Eu concordo e ainda ouso complementar que enquanto houver brinquedo (de verdade) haverá infância. Sua exposição reúne brinquedos populares feitos à mão, como bonecas de pano, panelas de barro, bolas de meia… Em um mundo tão tecnológico, que apelo eles têm hoje? Sálua, no vídeo que é apresentado na exposição (e que disponibilizei alguns parágrafos acima), diz – já com olhos marejados – que “(…) queria que soubessem que tem pessoas que fazem esses brinquedos. E eu me emociono muito com isso”. Sua emoção é comovente e inspiradora, ao mostrar o que é brincar de verdade. Ao mostrar o encantamento que a simplicidade propicia. Ao mostrar que brincadeira é tato. Ao mostrar que o mais importante é o vínculo afetivo que se cria, além das descobertas que o brincar propicia.

Em meu nome e em nome de minha família, eu te agradeço, querida professora, pela generosidade, pelo trabalho, e por me fazer acreditar ainda mais em meu projeto. Quem sabe um dia não trocamos figurinhas?

😉

 

Serviço
Exposição Brinquedos à Mão – Coleção Sálua Chequer
CAIXA Cultural Rio de Janeiro – Galeria 3 (Av. Almirante Barroso, 25 – Centro)
Abertura: 17 de dezembro de 2016 (sábado), às 17h
Visitação: de 18 de dezembro de 2016 a 19 de fevereiro de 2017 – de terça-feira a domingo, das 10h às 21h
Telefone: (21) 3980-3815
Classificação inicativa: Livre
Entrada Franca

Fontes:
https://www.facebook.com/BrinquedosaMao
http://oglobo.globo.com/sociedade/conte-algo-que-nao-sei/salua-chequer-educadora-pesquisadora-gente-deixa-de-ser-crianca-quando-quer-20766291#ixzz4Xm4rVSFG
http://www20.caixa.gov.br/Paginas/Noticias/Noticia/Default.aspx?newsID=4420

2 Comment

  1. Belíssimo texto, Eduardo! Encanta, comove e aguça. Bendita seja a criança que ainda permanece em você!

    1. Obrigadíssimo, Catherine! Alguns textos em seu belíssimo blog ArtenaRede auxiliam muito na lembrança desta criança que teima em se manifestar! 🙂

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